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sábado, 19 de janeiro de 2013

Dos Arquivos do Smithsonian Institution

“Um filme sem uma mensagem é apenas um desperdício de tempo.”
D.W. Griffith 


 Greta Garbo. 1925. Arnold Genthe.


 Rodolfo Valentino. c. 1925. Russell Ball.


 Ernst Lubitsch à direita com Emanuel Cohen. c. 1930.

"Pelo menos duas vezes por dia o ser humano mais digno é ridículo"
Ernst Lubitsch


 Peter Lorre. 1935. Lusha Nelson.


 Orson Welles. 1938.


 Stan Laurel e Oliver Hardy. 1938. Harry Warnecke.


W.C. Fields.1938. Harry Warnecke e Lee Elkins.


 Greta Garbo. 1939. Clarence Sinclair Bull.


 Orson Welles. 1939. Harry Warnecke e Lee Elkins.


 Veronica Lake. 1941. George Hurrell.

"Sou a favor do costume de se beijar a mão de uma mulher quando 
somos apresentados. Afinal, é preciso começar por algum lado".
Sacha Guitry 


 Ida Lupino e Howard Duff no filme "Woman In Hiding". 1949.


Elia Kazan dirigindo Karl Malden e Vivien Leigh em "A Streetcar Named Desire".1950.


“É o fim da Civilização!” 
Guillaume Apollinaire (à saída de uma sessão de cinema).




(Fotos da National Portrait Gallery, Smithsonian Institution, www.si.edu)




quinta-feira, 19 de abril de 2012

Lillian Gish

"A cabra inventou os grandes planos"

(frase atribuida a Bette Davis)


Lillian Gish com 19 anos, em 1912. Foto em silentsaregolden.com.
Lillian Gish, com 92 anos em 1985. Foto em LIFE Archive.


"O palco era a nossa escola, nossa casa, nossa vida."
(Lillian Gish)


«Atriz norte-americana, Lillian Diana de Guiche nasceu a 14 de outubro de 1893, em Springfield. Como o seu pai estava constantemente ausente de casa, a sua mãe foi obrigada a empregar-se como atriz, para poder sustentar a família. A jovem Lillian estreou-se nos palcos com a tenra idade de 5 anos, ao lado de sua irmã Dorothy. Tornaram-se amigas da atriz Mary Pickford, que não hesitou em recomendá-las ao realizador D. W. Griffith que as contratou como figurantes do filme An Unseen Enemy (1912). Lillian tornou-se uma das atrizes preferidas de Griffith, que apreciava a sua beleza frágil.


Dorothy Gish, D.W. Griffith e Lillian Gish, 1922. 
Foto em mothgirlwings.tumblr.com

Com ele trabalharia em filmes como The Lady and the Mouse (1913), The Birth of a Nation (O Nascimento Duma Nação, 1915), Intolerance (Intolerância, 1916), Broken Blossoms (O Lírio Quebrado, 1919) e Way Down East (1920). Chegou mesmo a tentar a carreira de realizadora com Remodeling Her Husband (1920), protagonizado pela sua irmã Dorothy, mas os resultados comerciais ficaram aquém do esperado. Gish foi sem dúvida a atriz mais solicitada do cinema mudo, tendo filmado entre 1912 e 1920 cerca de 60 filmes. Em 1923, resolveu tentar uma carreira na Europa, protagonizando dois títulos de Henry King: The White Sister (A Irmã Branca, 1923) e Romula (1924), mas os filmes padeceram de alguma inconsistência narrativa e traduziram-se em fracassos comerciais.


Lillian Gish e Greta Garbo durante as filmagens de O Vento (The Wind, 1928) de Victor Sjöström. Foto em criticaretro.blogspot.pt.

Aceitou depois integrar os quadros dos estúdios MGM, onde filmou La Boheme (1926), The Scarlett Letter (1926) e The Wind (O Vento, 1928), de Victor Sjöstrom, que foi o seu último filme mudo. O insucesso comercial deste título, aliado à ascensão de atrizes como Greta Garbo e Joan Crawford, fez com que Gish fosse despedida da MGM. Depois do seu primeiro filme sonoro One Romantic Night (1930), Gish decidiu dedicar-se exclusivamente ao teatro. Na Broadway, surgiu triunfante, encabeçando êxitos como Uncle Vanya (1935) e Hamlet (1941), ao lado de John Gielgud. Em plena Segunda Grande Guerra, regressou a Hollywood, filmando títulos como The Commandos Strike at Dawn (Os Comandos Atacam ao Amanhecer, 1942) e Top Man (1943). 


Lillian Gish e Jennifer Jones no filme Duelo ao Sol (Duel in the Sun, 1946) de King Vidor. Foto em mythicalmonkey.blogspot.pt. / Lillian Gish e as crianças do filme A Sombra do Caçador (The Night of the Hunter, 1955) de Charles Laughton. Foto em theendzone.blogspot.pt.


O seu regresso em força deu-se com a sua personagem de Laura Belle em Duel in the Sun (Duelo ao Sol, 1946), que lhe valeria a nomeação para o Óscar de Melhor Atriz Secundária. A partir daí, limitou-se a dignificar com a sua experiência alguns filmes de inferior qualidade. As exceções foram The Night of the Hunter (A Sombra do Caçador, 1955), onde Gish arrancou uma poderosa interpretação enquanto matriarca que protege duas crianças ameaçadas por um religioso psicopata (Robert Mitchum) e The Unforgiven (O Passado Não Perdoa, 1960). Em 1970, recebeu um Óscar Honorário pelo seu contributo para a dignificação da atividade cinematográfica. Aos 93 anos, ainda fez um surpreendente regresso ao lado de Bette Davis em The Whales of August (As Baleias de agosto, 1987). Faleceu em Nova Iorque a 27 de fevereiro de 1993.»(In, www.infopedia.pt)


A Sombra do Caçador (The Night of the Hunter, 1955) de Charles Laughton.




domingo, 8 de abril de 2012

O Beijo no Cinema


por 

Alves Costa

publicado no jornal  A Capital em 17-04-1971


Coisas boas em jornais

Esta é a primeira imagem sempre em movimento de um beijo. Foi seleccionado para preservação no National Film Registry. Cena de uma comédia de palco, "A viúva Jones", interpretado por May Irwin e John C. Rice. De acordo com o historiador de cinema Edison C. Musser, os actores encenaram o beijo para a câmara, a pedido do jornal New York World, e o filme resultante foi o mais popular filme Vitascope Edison em 1896. Filmado Abril de 1896, no Edison's Black Maria Studio. Embora Alves Costa no texto diga que foi em 1895. Foto encontrada em museucine.wordpress.com.


ENQUANTO os irmãos Lumière se preparavam para apresentar o seu cinematógrafo, já nos kinetoscópios de Edison podiam ver-se imagens reais em movimento. Edison não tinha conseguido encontrar um processo de projectar convenientemente os seus filmes sobre um grande écran. Nos kinetoscópios, o espectador espreitava por uma luneta para ver pequenos filmes de um minuto. A imagem exibida era muito pequena e mal iluminada, E os assuntos pouco variados: uma luta greco-romana, uma mulher a atirar ao alvo, um acrobata, uma dança de selvagens, habilidades de um malabarista, um fumador de ópio ou o revoltear de uma bailarina envolta em véus transparentes. Os kinetoscópios funcionavam como uma slot machine e eram postos, em número variável, à disposição do público, com outros aparelhos de diversão ou de jogo, em vastos recintos conhecidos pelo nome de Penny Arcades. Isto passava-se no fim do século XIX. Na mesma altura, fazia grande sucesso, num dos teatros da Broadway, um momento da comédia "A viúva Jones" em que os artistas May Irvin e John C. Rice davam um beijo em cena. Para renovar os assuntos habituais dos filmezinhos dos kinetoscópios, Raff e Gammon tiveram a ideia de filmar esse momento em grande plano. Os dois artistas foram fotografados a meio busto. Encostavam os rostos e Rice aflorava os seus grandes bigodes a um lado da boca de Mary Irvin. E era tudo. Nem um nem outro eram já muito novos. O penteado, o rosto gorducho e a opulência do busto de Mary; a bigodaça e os altos colarinhos engomados de John dão a esta cena — vista hoje — um misto de ridículo e de encanto na sua enternecedora ingenuidade. 

Greta Garbo e John Gilbert em O Demónio e a Carne (Flesh and the Devil, 1926) de Clarence Brown. Foto encontrada em mythicalmonkey.blogspot.pt. / Clark Gable e Vivian Leigh em E Tudo o Vento Levou (Gone With The Wind, 1939) de Victor Fleming. Foto encontrada em weheartit.com.


O beijo de Mary Irvin e John Rice (0 primeiro beijo do cinema) foi filmado em 1895. Enquanto vista nos kinetoscópios, a imagem três vezes repetida desse beijo era tão pequena e tão pouco nítida que não despertou um interesse por aí além. Mas quando, um ano mais tarde, o filme pode ser projectado num écran, onde as figuras apareciam com o triplo do tamanho natural, foi um escândalo! E uma revista de Chicago, The Chap Book, de 15 de junho de 1896, referia-se-lhe indignadamente nestes termos : «Devem lembrar-se de que, numa peça recente, A viuva Jones, «miss» Mary Irvin e um certo John C. Rice trocavam beijos em cena. Nenhum deles era fisicamente atraente e o espectáculo dessa pastagem (sic) recíproca nos lábios um do outro já era difícil de suportar. Ao natural era grosseiro. Mas nada de comparável com o efeito que produz esta cena ampliada para proporções gigantescas e repetida três vezes de seguida. É absolutamente repugnante. Tudo o que resta do encanto de «miss» Irvin desvanece-se. A sua actuação torna-se indecente e de uma desmedida grosseria. Tais factos pedem a intervenção da polícia.» 


Burt Lancaster e Deborah Kerr em Até à Eternidade (From Here to Eternity, 1953) de Fred Zinnemann. Foto encontrada em wonderrland.blogspot.pt. / Marilyn Monroe e Tommy Noonan em Os homens Preferem as Loiras (Gentlemen Prefer Blondes, 1953) de Howard Hawks. Foto encontrada em www.thisismarilyn.com.


Passaram os anos... e o beijo voltou  a aparecer, uma vez por outra, no écran. Mas, ainda durante muito tempo, o beijo, no cinema, foi casto, tímido, fugaz e quase sempre no  rosto, antes de se tornar fim obrigatório e indispensável dos filmes de Hollywood. Hoje, é coisa tão natural, tão vista e tão vulgar que já mal se lhe presta atenção. Mas sessenta anos atrás perturbava seriamente os impressionáveis espectadores de cinema... Quando, em 1910, apareceram os primeiros filmes que mostravam dois apaixonados beijando-se na boca, o escândalo que causaram não fói menor do que havia causado, na América, o cândido Beijo de Mary Irvin e John Rice destinado aos espectadores solitários dos kinetoscópios quinze anos antes! O crítico do International Film Zeitung, Félix Holden, escreveria, amarguradamente chocado : «O beijo transformou-se totalmente. Os heróis do cinema já não se contentam com beijar-se rapidamente como nos bons velhos tempos. Agora unem os lábios demoradamente, com volúpia, e a mulher reclina a cabeça para trás em pleno êxtase.»... Referia-se aos filmes dinamarqueses...



Este beijo não pode ser mostrado em foto, tem de se ver toda a cena que está logo no inicio. Ele é, o melhor beijo de todos os filmes que vi e foram muitos. John Wayne e Maureen O'Hara em O Homem Tranquilo (The Quiet Man, 1952) de John Ford.


É que  os dinamarqueses, ao criarem a vamp (e a primeira e mais famosa delas foi a grande artista dramática Asta Nielsen), introduziram, também, nos seus filmes — então com grande expansão na Europa-- os beijos longos e apaixona-dos. Conta Georges Sadoul, em Le cinéma devient un art, que «os beijos à dinamarquesa chegaram a chocar também a Imprensa parisiense na primeira década deste século e que, por causa deles, frequentemente achavam que as fitas da Nordisk eram lascivas ou escabrosas». Então e ali — ao contrário do que iria acontecer no cinema de Hollywood — o beijo não se aliava a um fim feliz. No reino da Dinamarca o fim , trágico era de regra. Um pouco antes dos anos vinte, o cinema italiano atingira o apogeu. Depois da vaga de filmes histéricos que iriam influenciar até o cinema americano (consta que Griffith teria estudado o filme Cabiria antes de se lançar na realização de Intolerância), os italianos voltaram-se para o presente e, por seu turno, trouxeram a diva para os seus dramas passionais. E tão famosas, como Asta Nielsen, foram as mulheres fatais do cinema transalpino. A Lyda Borelli, a Francesca Bertini, a Pina Menichelli, a Hesperia, a Maria Jacobini vieram, então, perturbar os espectadores de todo o mundo, com as suas atitudes coleantes, o ardor do seu olhar, o arrebatamento dos seus beijos. 


Marlon Brando e Anjanette Comer em The Appaloosa (1966) de Sidney J. Furie. Foto encontrada em classicmoviestills.com. / Audrey Hepburn e George Peppard em Boneca de Luxo (Breakfast at Tiffany's, 1961) de Blake Edwards. Foto encontrada em www.foolzfun.com.


Mas, nessa altura, já não causavam escândalo, provocavam uma desmedida admiração. «Depois de 1914 - escreveria Sadoul, na obra citada — o divismo tornou-se loucura no cinema italiano. Enquanto que o star-system especula com o sex-appeal ou a beleza americana, na medida em que o público paga, na Itália os financeiros e os duques arriscavam a sua fortuna pelo amor de uma diva, de uma donna muta, como chamavam, então, ás estrelas italianas. Estes novos barões de Nucingen investiram os seus milhões em sociedades de produção onde as suas amadas eram senhoras absolutas. Produtores e realizadores tornaram-se fiéis escravos do prestígio e da beleza dessas mulheres idolatradas. Um romantismo semifeudal envolvia de latino ardor cada uma dessas donnas mutas que, agitando os seus belos braços e sacudindo a sua luxuriante cabeleira, conduziam, no meio dos paroxismos da paixão, o cinema ita1iano para a decadência e a ruína.» 
Também em Portugal não se escapou ao fascínio das divas. Em 1917, o beijo das divas era igualmente, entre nós, motivo para arrebatamentos inflamados... e publicamente confessados, como se vai ver. Em 1 de Junho de 1917, Leopoldo O'Donnell, empresário-gerente do Cinema Olímpia, de Lisboa, promoveu uma matinée de arte de homenagem a Lyda Borelli, Pina Menichelli e Francesca Bertini, precedida de uma conferência. Deste acontecimento deu conta a «Cine-Revista», no seu n.° 4, nestes termos: «As grandes trágicas do cinema foi o tema escolhido pelo distinto poeta António Ferro para a sua conferência cinematográfica realizada no dia um do corrente, em matinée de arte no Salão Olímpia. Facultado gentilmente pelo seu autor, começamos hoje a publicar esse primoroso trabalho. (...) A iniciativa do sr. António Ferro abre, sem dúvida, um movimento intelectual valiosíssimo em volta do importante papel reservado à cinematografia em todos os ramos da actividade e do saber humanos.»


Paul Newman e Joanne Woodward em A New Kind of Love (1963) de Melville Shavelson. Foto encontrada em www.acertaincinema.com.


A conferência é muito longa, mas vale a pena. reproduzir os parágrafos finais que António Ferro dedica ao beijo das divas homenageadas «Quero marcar bem, num rápido confronto, o temperamento de cada uma das trágicas de que falei. Para fazer, perdoem-me o arrojo, achei uma solução. Surpreender a sua alma através do seu beijo. O beijo é a melodia da alma, a melhor maneira de ela respirar, como afirma Edmond Rostand... O beijo é a síntese de todos os sentimentos, o sinete do amor. Assim, o beijo de Francesca Bertini é o beijo desvairado, o beijo que soluça, o beijo que se entrega, o beijo que floresce, o beijo doido, virgem, que apenas quer ser beijo. O beijo de Pina Menichelli é o beijo maldoso, o beijo que faz doer, que faz dos seus lábios punhais e dos nossos ferida, o beijo Judas, beijo fatídico que faz da boca taça onde ele é veneno que nos mata. O beijo de Lyda Borelli é, porém, o mais belo de todos, o mais cristão, o mais estilizado, jóia de preço que eu quisera ver nos meus lábios... É um beijo que, pelo burilado da forma, lembra um soneto de Verlaine. Depois deste delírio, António Ferro termina, sem dúvida sob entusiásticos aplausos da selecta assistência, com estas palavras: «Numa última síntese, o beijo de Francesca Bertini é o beijo humano, é o beijo mulher. O beijo de Pina Menichelli é o beijo diabólico, o beijo Satanaz. E, finalmente, o beijo de Lyda Borelli é o beijo divino, o beijo arte, o beijo Deus.» Era assim emocional e impressionável, como o reflectem estas palavras de António Ferro, como o reflectem palavras semelhantes publicadas em revistas da época, o público dos cinemas em 1917. O beijo das mulheres fatais, das grandes amorosas, deixara de ser escândalo. Era motivo de uma geral e alienadora admiração... tão ardente como risível. O tempo voltou a passar. O cinema evoluiu... e o público também. Hoje, já nenhuma vedeta do écran poderá gabar-se de provocar tais arrebatamentos. E o beijo, no cinema, tomado na sua dimensão natural, tornou-se moeda corrente... e desvalorizada.

Texto de Alves Costa, publicado no jornal  A Capital em 17-04-1971


Neve Campbell e Denise Richards em Ligações Selvagens (Wild Things, 1998) de John McNaughton. Foto encontrada em cinemaepoesia-felipe.blogspot.pt. / Javier Beltran e Robert Pattison em Little Ashes (2008) de Paul Morrison. Foto encontrada em cinemaepoesia-felipe.blogspot.pt.


Ewan Mcgregor e Jim Carrey em Eu Amo-te Phillip Morris em (I Love You Phillip Morris, 2009) de Glenn Ficarra e John Requa. Foto encontrada em cinemaepoesia-felipe.blogspot.pt. / Sarah Michelle Geller e Selma Blair em Estranhas Ligações (Cruel Intentions, 1999) de Roger Kumble. Foto encontrada em www.autostraddle.com




sábado, 4 de junho de 2011

Greta Garbo por Gore Vidal

Greta Garbo.


«(...) Entretanto, uma feliz e voluntária relação entre mãe e filha estava a ter lugar todos os Invernos e, por vezes, de Verão também, em Klosters, na Suiça. Salka Viertel era viúva de um conhecido realizador alemão e mãe do escritor Pierre Viertel. Antiga actriz e argumentista, Salka fora escolhida por Greta Garbo para ser mãe dela. Salka morava na mesma rua que nós, junto ao pequeno apartamento onde Garbo ficava; fazia os seus exercícios de ioga na varanda para espanto dos aldeões, que não sabiam quem Frau Garbo era.
Garbo tinha simpatizado com o nosso cão terrier australiano, Rat. « Como é um nome muito brutal para ele, vou chamar-lhe Ratski.» E, assim, todas as manhãs, por volta das oito, ela passava pelo nosso apartamento e Ratski precipitava-se para a rua a fim de a cumprimentar. A seguir eu juntava-me a eles para o nosso passeio matinal ao longo do rio. Como sempre, Rat tomava o comando e só íamos aonde ele queria. Irvin Shaw e a mulher eram velhos amigos de Garbo e avisaram-nos para nunca discutirmos a carreira cinematográfica dela. Mas dava-se o caso de ser o assunto de que ela mais gostava de falar. lembrava-se dos pormenores de todos os filmes, incluindo os nomes do pessoal técnico. «Aprendi o meu mau inglês com eles», dizia, recordando-nos que fora estrela do cinema mudo e que todo o mundo se perguntava se a actriz sueca conseguiria fazer a transição para os filmes falados, tentativa que a sua co-estrela, John Gilbert, falhara.


 Greta Garbo e John Gilbert.


Ela não só gostava de falar dos velhos tempos como, passados tantos anos tinha curiosidade em saber o que era feito da MGM. Embora tivesse sido a rainha daqueles estúdios, não desprezava estar ao corrente das estrelas menores da corte.  Por um motivo qualquer, pensar na cantora Jeanette MacDonald fazia todas as actrizes desatarem a rir a bandeiras despregadas enquanto Judy Garland se punha a imitar a cançao de marca de Jeanette, San Francisco. Tinha, sem dúvida, a ver com as operetas antigas em que entrava Jeanette MacDonald juntamente com o parceiro Nelson Eddy, carinhosamente conhecido por «o capão cantor». Havia uma história que garbo adorava contar: Jeanette era casada com um actor chamado Gene Raymond, homem amável que actuou no meu filme, The Best Man. Uma manhã, Jeanette apareceu em casa com um chapéu de palha na cabeça, um cesto cheio de rosas recentemente colhidas e a trautear uma ária de A Azougada Marietta quando Raymond estava a jogar ténis no court do jardim. Ao entrar, ela lembra ao marido que o almoço está quase pronto e Raymond convida para almoçar o treinador, mas este desculpa-se: «Estou todo suado e não trouxe roupa.» Mas Gene Raymond diz-lhe: «Vai à minha casa de banho. Tem duche e uma data de roupa do teu tamanho.» O treinador assim faz. Entretanto, Jeanette está a pôr as rosas em jarras e, ao passar pela casa de banho do marido, ouve água a correr. Entra sorrateiramente lá dentro, mete a mão no duche e agarra nos genitais do treinador, cantando fortíssimo, «ding, dong. Não te atrases para o almoço!» Por esta altura, Garbo estava habitualmente morta de riso e a sua mão direita contorcia-se convulsivamente.


Greta Garbo.


Escreveu-se imenso sobre o seu encanto andrógino. Apesar de ser idolatrada como uma deusa por L. B. Mayer, o dono dos estúdios MGM, ambos estavam conscientes da razão da sua popularidade. As mulheres adoravam os filmes dela - sofria e tinha um tipo de beleza que raras pessoas possuíam. No entanto, não era popular entre os homens americanos, os quais preferiam o género de Betty Grable. as receitas ganhas pelos filmes com ela provinham sobretudo da Europa. Quando a Segunda Guerra Mundial pôs fim ao mercado europeu, Garbo afastou-se discretamente da MGM. Tiraria uma férias até a guerra acabar. Diz-se que Mayer chorou de gratidão. Ao contrário do que conta a lenda, ela não tencionava retirar-se e, quando a guerra terminou, Walter Wagner tinha um argumento para ela baseado em La Duchesse de Langeais, de Balzac, a ser filmado pela RKO. Garbo chegou até ao teste do guarda-roupa, uma maneira súbtil de o estúdio ver se ela ainda se parecia com a Greta Garbo. Parecia. Vi o teste. Nessa altura, ela estava na casa dos trinta. Infelizmente, o estúdio foi comprados por Howard Hughes. colega de aviação do meu pai, que cancelou o filme. É pena que o filme de Scorsese sobre Howard Hughes não mencione a única coisa que teria tornado Hughes famoso. Garbo ficou tão chocada por essa rejeição que nunca mais voltou a contracenar noutro filme. Também era muito rica e bastante preguiçosa.


Greta Garbo em Ninotchka de Ernst Lubitsch, 1939


Quando alguém me enviou uma grande lata de caviar, Howard decidiu fazer uma pequena festa só para nós, os Shaw e Greta Garbo. Ao último minuto, Irvin telefonou a perguntar se podia trazer a jornalista Martha Gellhorn. sempre gostei do que ela escrevia e simpatizava com todas as mulheres que se tinham casado com Hemingway. A pequena festa correu lindamente. Garbo chegou cedo e vestiu imediatamente o blazer de Howard. Gostava de se vestir com roupa de homem e costumava referir-se a si em termos masculinos. «Onde é que é a casa de banho dos rapazinhos?» era uma das suas expressões favoritas. Foi Ina Claire, a delicada comediante da Broadway, que foi à casa de banho dos rapazinhos logo depois de Garbo sair de lá e, de facto, o assento da sanita estava levantado.»
In, Navegação Ponto Por Ponto de Gore Vidal


Navegação Ponto Por Ponto de Gore Vidal.
 Editora: Casa das Letras, 2010.


«Gore Vidal faz uma viagem pela sua memória através dos bastidores da literatura, da televisão, do cinema, do teatro, da política e da alta sociedade. Com um estilo muito vivo e simples, como se estivéssemos a escutar uma longa confidência, Vidal salta de história em história, propõe reflexões. É simpático para umas personagens e impiedoso para outras. Nestas páginas encontramos episódios surpreendentes com Jacqueline Kennedy, Tennessee Williams, Eleonor Roosevelt, Orson Welles, Johny Carson, Greta Garbo, Federico Fellini, Rudolf Nureyev, Elia Kazan e Francis Ford Coppola. As páginas mais comoventes, escritas com pudor e subtileza, estão reservadas a Howard Auster, o seu companheiro de sempre, o homem com quem viveu mais de cinquenta anos. Navegação Ponto Por Ponto é um livro de memórias inteligente e elegante. Vidal começa com pequenas observações que crescem até ascenderem à sua devida grandiosidade. Um livro fluente, carregado de humor, simples, mas nunca simplista, vivo e glamoroso. Um livro de memórias imperdível.» 
(texto de promoção do livro)

(Fotos encontradas na net)