Mostrar mensagens com a etiqueta Eva Marie Saint. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Eva Marie Saint. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Marlon Brando - «The Contender»

por

Manuel Cintra Ferreira
Expresso, 1 de Julho de 2006


Coisas boas em jornais

Marlon Brando, Eva Marie Saint e Karl Malden em uma cena do filme, Há Lodo no Cais (On the Waterfront, 1954) de Elia Kazan. 1954. Alfred Eisenstaedt. Foto LIFE Archive.


Há, em quase todos os portugueses, um pouco de Terry Malloy. «I coulda been a contender», diz ele. Disse ele. Poderia ter sido um campeão. O condicional diz tudo. Poderia. O que faltou a Terry Malloy? O que falta aos portugueses para saírem da condição passiva, para deixarem de serem os homens de fretes no cais? Malloy vai encontrar a sua oportunidade no amor que lhe testemunha Edie Doyle (Eva Marie Saint), que lhe transmite a força capaz de o colocar de novo de pé, e lhe permite avançar, em passos vacilantes, para o armazém, dirigindo uma equipa de trabalho, agora liberta do medo dos «gangsters» que controlavam o sindicato dos estivadores, nos cais de Nova Iorque.
Estou a falar, como já muito bem entenderam, de Há Lodo no Cais, o filme de Elia Kazan, onde ganhou o seu primeiro Óscar um nome que então provocava paixões, e que ainda hoje é o testemunho único de uma forma de representar: Marlon Brando.


Marlon Brando, com o Óscar no braço esquerdo, falando com uma mulher não identificada na cerimónia dos Óscar's de 1955, no RKO, Theater, após receber o Óscar de Melhor Ator pelo filme, Há Lodo no Cais de Elia Kazan. Hollywood, EUA. 1955. George Silk. Foto LIFE Archive.



E uma forma de ser, também. De tal forma, que o que atrás disse sobre a personagem se poderia dizer sobre o protagonista. Brando foi um campeão. Isso ninguém contesta. Mas poderia ter sido muito mais. Brando poderia ter sido «o» actor por excelência, para além de ser o «modelo» que todos queriam copiar. Elia Kazan afirmou que Marlon Brando «arruinou» duas gerações de actores. A afirmação tem pertinência, na medida em que todo o novo actor que aparecia, seus contemporâneos ou da geração seguinte, em vez de seguirem o seu caminho procuravam, antes de mais, imitá-lo. Antes de se descobrirem a si próprios, fosse um Paul Newman, que o conseguiu, fosse um James Dean, que não teve tempo.


Marlon Brando e Anna Magnani durante as filmagens de, O Homem na Pele da Serpente (The Fugitive Kind, 1959) de Sidney Lumet. Foto gahetna.nl.


Brando foi, antes de mais, um «esbanjador» de talento; deitava-o às mãos cheias pelas janelas de uma série de filmes medíocres, de um Desirée (onde foi Napoleão) a Os Sedutores, de Ralph Levy. Inclusive, a partir de Duelo no Missouri (1976) não fez outra coisa senão expor-se, exibir-se como uma «curiosidade» mais do que como actor, e fazendo-se pagar na justa medida, ou seja, quase o «seu peso em ouro» (para 13 dias de trabalho em Superman cobrou 3,7 milhões de dólares e 10% dos lucros! Sendo o filme de 1978, façam as contas à inflação), o que talvez tenha sido a razão da sua entrega aos requintes culinários, especialmente guloseimas (ah! O belo sorvete!) que rapidamente o transformaram de «personalidade», numa imponente «rotundidade» cinematográfica (é vê-lo na última versão de A Ilha do Dr. Moreau, de John Frankenheimer, de 1996). 


Marlon Brando e Jane Fonda durante as filmagens de Perseguição Impiedosa (The Chase, 1966) de Arthur Penn. Foto gahetna.nl.


Mas mesmo nesta fase de «diletante» do ecrã, em que praticamente se recusava a estudar os argumentos, limitando-se a ler as suas deixas em cartões estrategicamente colocados, a sua presença e figura impunham-se sobre tudo e todos, dando-nos ainda a breve e soberba composição do coronel Kurtz em Apocalipse Now, de Coppola, e conseguindo uma nova nomeação para o Óscar (de actor secundário) em 1989 no papel de um advogado em Assassinato sob Custódia. E o seu último grande papel (a tempo inteiro!), em O Último Tango em Paris, de Bernardo Bertolucci, feito em 1972, é um filme em que a sua persona cinematográfica se confunde com a sua pessoa, quando evoca memórias familiares que poderiam ter sido suas.


Marlon Brando e Elizabeth Taylor durante as filmagens de Reflexos num Olho Dourado (Reflections in a Golden Eye, 1967) de John Huston, baseado no livro da grande escritora Carson McCullers. 1966. Loomis Dean. Foto LIFE Archive.



Digam o que disserem do que ele fez nestes anos pródigos, em que brincou consigo próprio e esbanjou o talento, ninguém pode negar ou desvalorizar o papel que ele teve na década de 50 e da «revolução» (só este termo se aplica ao que ele fez) que trouxe para o trabalho do actor, no palco ou no cinema. Há os que não lhe perdoam ter abandonado os palcos, aonde nunca voltou quando triunfou no cinema com a adaptação do seu sucesso no teatro, Um Eléctrico Chamado Desejo, dirigido por Elia Kazan. Já tivera uma experiência (O Desesperado, de Fred Zinnemann) mas foi o drama de Tennessee Williams que lhe abriu as portas da glória. Bastaria este filme, e também Há Lodo no Cais e o seu Don Corleone de O Padrinho, para o colocarem no panteão das glórias do cinema.
Mas poderia ter sido muito mais, ou algo mais. Não apostou na carreira de realizador (apesar de não se ter saído mal com o «western» Cinco Anos Depois), e transformou a de actor numa espécie de desfile carnavalesco. O que o levou a desistir? Medo do próprio triunfo. Ou apenas fatalismo? Haveria qualquer coisa de português em Brando? Não deixo de pensar nisto quando vejo um filme dele. E não estou, agora, a pensar no Mundial de futebol.

Manuel Cintra Ferreira
Expresso, 1 de Julho de 2006




Marlon Brando em O Padrinho (The Godfather, 1972) de Francis Ford Coppola.




quinta-feira, 10 de maio de 2012

Otto Preminger e o factor humano

"Eu não recebo conselhos de actores,
eles estão aqui para trabalhar"
Otto Preminger



O actor Otto Preminger 

Aos 4.05m tem uma cena de Otto Preminger, como oficial nazi Oberst von Scherbach,  chefe do Stalag 17, campo de prisioneiros alemão, no filme de Billy Wilder do mesmo nome de 1953 e que se chamou em Portugal; "O Inferno na Terra". As suas aparições no filme "roubam a cena" devido ao seu enorme carisma, além de sua composição caricata que, propositadamente, beira o ridículo - vale lembrar que, assim como Wilder, Preminger também era austríaco e judeu, e fora para os Estados Unidos fugindo da sombra nazi que já "rondava" seu país antes mesmo da eclosão da guerra; os dois cineastas também brincam aqui com a fama de Preminger, conhecido por ser rude e desagradável com seus actores - é como se o seu oficial nazi fosse uma paródia dele mesmo. 
(In, cinemacommel.blogspot.pt)

Olha que dois austríacos: Billy Wilder e Otto Preminger, 
um encontro nas filmagens do filme "Porgy and Bess", 1959.

«Tirânico, autoritário e intransigente. Esses são os adjectivos mais lembrados pela maioria dos actores e da equipe técnica que trabalhou com Otto Preminger. De fato, ele não tolerava incompetência, conversa fiada e tempo perdido. Nas suas mãos, era comum ver profissionais chorando, sendo humilhados, abandonando os sets, sendo demitidos – e readmitidos mais tarde. Para cada um que tivesse uma palavra de carinho a seu respeito (John Wayne, Henry Fonda, Joan Crawford, Dana Andrews, Don Taylor, James Stewart, Burgess Meredith e Frank Sinatra), havia outros tantos que lembravam da sua figura com um certo amargor ou até mesmo desprezo. (Karl Malden, Alice Faye, Kirk Douglas, Robert Mitchum, Linda Darnell, Dyan Cannon, Liza Minnelli, Jean Serberg e Tom Tryon). Em seus filmes, não havia espaço para improvisações. Ao actor era terminantemente proibido se afastar do argumento. E ai daquele que o procurasse com dúvidas sobre a psicologia do personagem. Para Preminger, o estilo Actor´s Studio de representar não passava de uma grande patetice.


Otto Preminger e Saul Bass durante a preparação do genérico para o filme "Anatomy of a Murder" (Anatomia de um crime,1960), Gjon Mili e durante as filmagens de "In Harm's Way" (A Primeira Vitória, 1965). Ralph Crane.


Otto Ludwig Preminger nasceu em 05 de dezembro de 1905 (ou 1906, segundo algumas fontes). Embora haja dúvidas em relação à sua cidade Natal (poderia ser Wiznitz, na Roménia, ou Rozniatow, na Polónia), seu biógrafos atestam que ele não nasceu em Viena. De todo o modo, Preminger se mudou para a capital austríaca aos 10 anos, quando seu pai Markus, foi transferido na condição de conselheiro jurídico da corte militar. Ainda na idade escolar Preminger logo começou a mostrar um interesse pelas artes, especialmente pelo teatro, ópera e literatura. Em 1922, ele já havia desempenhado pequenos papéis em montagens amadoras de Shakespeare. Sua sorte mudou no ano seguinte, ao conhecer o director teatral Max Reinhardt, pelas mãos de quem Preminger teria suas primeiras chances como actor profissional.


Otto Preminger ensaindo com Sidney Poitier em "Porgy and Bess", 1959 e Otto Preminger demonstrando com a actriz Jill Haworth como ele quer uma cena para o filme "Exodus", 1960.


A essa altura do campeonato, Preminger decidiu que sua vida estava no palcos e não na Faculdade de Direito que já frequentava. Para desconforto do pai, ele trancou a matricula do curso (que acabaria concluindo em 1928), e se enfiou de vez no mundo dos espectáculos. Entre 1926 e 1931, peregrinou por vários teatros da Europa e começou a dirigir algumas peças. A experiência chamou a atenção de alguns produtores que aceitaram patrocinar o seu primeiro trabalho para o cinema: "Die Grosse Liebe" ainda na Áustria em 1931.


Otto Preminger dirigindo Sidney Poitier e Dorothy Dandridge no filme "Porgy and Bess" 1959, e Otto Preminger dirigindo Dorothy Dandridge e Diahann Carroll no mesmo filme.


Otto Preminger dirigindo Sidney Poitier e Dorothy Dandridge no filme "Porgy and Bess" 1959.


Otto Preminger dirigindo Sammy Davis Jr. no filme "Porgy and Bess" 1959


Nesse momento, Preminger já era um nome associado à produção cultural de Viena. Em 1933, assumiu a direcção do teatro criado anos antes por Reinhardt. Em 1934, recebeu um convite do Governo da Áustria para tomar conta da companhia teatral do país, o que foi obrigado a recusar por motivações religiosas. Ironicamente a oportunidade perdida salvaria sua vida, já que, em 1938, quando Hitler invadiu a Áustria e começou a exterminar um judeu a cada esquina, Preminger estava dirigindo filmes em Hollywood, a quilómetros de distância da Europa.
Sua retirada da Europa começou a se desenhar em abril de 1935. Nesse ano, Preminger foi procurado pelo americano Joseph Schenck, um dos executivos da recém criada Twentieth Century-Fox. A fama de Preminger como director teatral atravessara o Atlântico e Schenck queria levar toda a aquela competência de que ouvira falar para a terra do Tio Sam. Preminger não pensou duas vezes e disse: "jawohl!!". Seu navio aportou nos EUA em 21 de outubro de 1935, data que ele consideraria para sempre como seu segundo aniversário.» (In, cineplayers.com)
 Ler aqui a biografia completa de Otto Preminger


Entrevista  a Otto Preminger, 1972.


Otto Preminger dirigindo Paul Newman no filme "Exodus", 1960.


Otto Preminger dirigindo Eva Marie Saint no filme "Exodus", 1960.


 Otto Preminger durante as filmagens do filme "Exodus", 1960.


 Otto Preminger durante as filmagens do filme "Exodus", 1960.



(Fotos Gjon Mili e LIFE Archive)