sexta-feira, 29 de março de 2013

Elmyr de Hory - O falsificador gentil


Texto de
Manuel S. Fonseca
16 de Outubro de 2010


Elmyr de Hory. Londres, Inglaterra. 1972. Terence Spencer.

Foi um charlatão que é, como bem sabem, o nome que se dá a certos homens de talento. Elmyr iluminou o século XX, de 1906 a 1976. Para os convenientes efeitos de registo chamemos-lhe Elmyr de Hory. Um volátil De Hory que mudou até à exaustão da capacidade do alfabeto: Bory, Cory, Dory, até Zory, para já não falar de Dory-Boutin, Herzog, Hoffman ou Cassou. You name it! Em português: digam nomes!
Mas estou, já é costume, a contar mal a história até porque é difícil estabelecer-lhe a biografia e a investigação não é o meu forte. Nasceu na Hungria, em família aristocrática – e é mentira. O pai era embaixador austro-húngaro – e é mentira. A mãe descendente de consolidada linhagem de banqueiros – e é mentira. Tudo factos, tudo mentira.
Aos 18 anos estava em Munique a estudar Belas-Artes. Dois anos depois, em 1926, já está em Paris, onde foi aluno, muito bom, de Fernand Léger. Tudo factos, tudo verdades. Em Paris, converteu-se ao prazer da vida, da seda, do champagne, das festas, do grande estilo.
Os anos totalitários que precedem a guerra, apanham-no em Budapeste. Tem uma breve passagem pela prisão, por ligação a um espião britânico. Soltam-no, mas um ano depois os nazis espetam com ele num campo de concentração, acusando-o de judeu e homossexual. Sabe-se que não era judeu e sabe-se que era homossexual convicto e praticante. Foi espancado, mas o seu forte instinto de sobrevivência teve artes de engendrar a fuga de um hospital de Berlim. Desenhou, através do império nazi, uma fina linha de trapaças e subornos que o trouxe de volta a França.

Elmyr de Hory, ao lado de um Matisse forjado por ele.1969. Ibiza, Espanha. Pierre Boulat.

Quando a Guerra acabou, o brilhante Elmyr tentou ganhar a vida com os quadros que pintava. Descobriu que mesmo que não morresse à fome, não vestiria casaca e não entraria no mundo de riqueza, volúpia e celebridade a que aspirava. Já se sabe: com a fome vem sempre uma grande vontade de comer e Elmyr descobriu que desenhava Picassos com uma facilidade cândida, infantil. Como há homens que nascem com uma mulher dentro deles e vice-versa, Elmyr descobriu que o seu corpo abrigava outro Picasso. Pelo menos no circuito que se estabelecia entre as suas mãos, os seus olhos e o seu cérebro.  
O primeiro Picasso vendeu-o a um amigo inglês que o tomou, para silenciosa surpresa de Elmyr, por um original. Há silêncios que desencadeiam vocações. Nesse dia de 1946, Elmyr deixou-se cair nos braços da fraude e da falsificação, num certo sentido, num mundo mágico de trickery e make-believe. Paris voltava a ter o seu Houdini. Primeiro os desenhos de Picasso, a que prontamente Elmyr acrescentou desenhos de Matisse, Modiglinani e Renoir.

Clifford Irving, sua mulher Edith, Elmyr de Hory, Gerry 
Albertini e Bob Kirsh. 1972. Ibiza, Espanha. Pierre Boulat.

Vendia-os porta a porta, galeria a galeria. Essa era a parte mais difícil. Elmyr tinha o seu orgulho e o acto de venda, a persuasão do seu interlocutor, era-lhe estranha. Muito mais tarde, já nos anos 50, entrou numa galeria de Los Angeles, abriu o portfolio e Frank Perls, o galerista, ficou abismado com os Picassos e Modiglianis. Tão abismado que desconfiou. Fechou a pasta atirou com ela a Elmyr, gritando-lhe que a porta da rua era a serventia da casa. Elmyr saiu engolindo a humilhação, mas já na rua voltou-se para Perls e perguntou-lhe: “Mas acha que os desenhos estão bem feitos?” E Perls sabia, soube logo, que aqueles desenhos eram obras-primas de falsificação.
Era um falsificador gentil. Não estava ali para enganar ninguém: queria que os seus Picassos e os seus Renoirs fossem amados. Esse amor era a primeira e mais importante remuneração. Acabou por organizar-se para potenciar o melhor de si. Entregou a terceiros a venda. Foi obviamente vítima de fraude. Todos os parceiros com que trabalhou – arduamente, entenda-se – o enganaram miseravelmente nas contas.

 Pinturas falsas de Matisse e Modigliani, pintadas por Elmyr de Hory.

Elmyr teve a sua maior glória na década de 50. Viajou até aos Estados Unidos e era como se tivesse chegado ao paraíso. Tinha visto de 3 meses, ficou uma década. Dos desenhos passou aos óleos. Comprou livros (só queria um décimo da biblioteca de arte dele) e estudou estilos. A pouco e pouco alargou o seu portfolio: Vlaminck, Chagall, Toulouse-Lautrec, Dufy, Derain, Degas, Bonnard vieram juntar-se aos primeiros mestres. Não tenho a certeza, mas rezo para que nunca tenha falsificado um Léger. (Hei-de ser sempre um sentimental e tenho a certeza de que Elmyr também o era).
Vai sem dizer que Elmyr não era um copista. O que ele desenhava, o que pintava, eram novas obras desses mestres. Genuínas, inéditas. Geniais, como genial era o Matisse que vendeu ao Fogg Art Museum, na Universidade de Harvard. Os peritos viram e os peritos reconheceram-lhe a autenticidade. Compraram-no e, digo eu para envernizar mais esta história, expuseram-no.
E foi aqui que se torceu da que sabem o belo rabo. Mais tarde, novas peritagens descobriram a fraude. E outros coleccionadores – ó os texanos!!! * – descobriram que tinham sido tão suavemente comidos.

 Elmyr de Hory e David Walsh. 1969. Ibiza, Espanha. Pierre Boulat.

Os anos que se seguiram foram anos de fuga e clandestinidade. De luxo ainda, em Ibiza. Os anos em que, com alguma bondade, Elmyr, o charlatão tímido, permitiu, condescendente, que outro charlatão, Clifford Irving ( o escritor que tinha forjado uma biografia de Howard Hughes e por isso tinha sido preso) escrevesse a sua história. E que esse mago da manipulação chamado Orson Welles o fixassse para a eternidade, no filme F for Fake.
Informado de que o governo espanhol cedera ao pedido de extradição da França, o que o significaria acabar os seus anos na cadeia, a 1 de Dezembro de 1976, Elmyr tomou uma overdose de comprimidos e morreu nos braços de Mark Forgy, seu companheiro.

 *Algur H. Meadows, magnata texano do petróleo, descobriu que tinha a mais ampla, mas também a melhor colecção do mundo do falsificações de Degas, Bonnard, Matisses, Picassos e outros pintores menores. Com um sentido de humor mais negro do que o ouro que os tinha pago, Algur espumou de raiva e lançou todos os seus cães, do FBI à Interpol, em busca dos mágicos falsificadores.

Texto de
Manuel S. Fonseca
encontrado em www.etudogentemorta.com
16-10-2010

Um falso Van Dogen pintado por Elmyr de Hory.


(Fotos LIFE Archive)
Pinturas falsas de Elmyr de Hory encontradas na net




terça-feira, 26 de março de 2013

Nina Leen - Fotógrafa da LIFE


«Menos conhecida do grande público, a fotógrafa Nina Leen (1909-1995) entrou para a LIFE em 1945 e assinou dezenas de capas. Nascida na Rússia, viveu em vários países da Europa antes de se instalar em Nova York. Leen não era a fotógrafa das grandes reportagens e das zonas de conflito. Se notabilizou pelos editoriais de moda, pelos retratos de artistas e intelectuais. E, principalmente, pelas matérias que retratavam a sociedade americana do pós-guerra. A técnica apurada na composição, ângulos e iluminação extremamente bem elaborados, fazem das fotografias de Nina Leen verdadeiras obras-primas de sutileza e elegância.»
Alexandre Belém
In, veja.abril.com.br

 Nina Leen de pé, em frente de uma projecção de uma das suas fotos. 1958. Gordon Parks.

 Nina Leen Exhibit Box #1-D. Sem data.

 Nina Leen Exhibit Box #1-D. Sem data.

 Father & Child. Sem data. Nina Leen.

 Carole Landis chegando na igreja para o seu casamento acompanhada por Kay Francis. 1943. Nina Leen.

Night-Club Girls. 1952. Nina Leen.

Le Corbusier no seu atelier de arquitectura em Paris. 1946. Nina Leen.

O tenor Lauritz Melchior e esposa, brincando com o seu Grand Danois. 1944. Nina Leen.

 Joan Roberts vestida com o traje para o musical "Oklahoma", rindo de 
como o seu bulldog "Óculos", levanta a perna num poste. 1944. Nina Leen.

 Summer Beach Fashions. Florida. 1950. Nina Leen.

 Summer Beach Fashions. Florida. 1950. Nina Leen.

 Nina Leen em acção. Sem data.

Nina Leen com a sua Rolleiflex. 1945.


(Fotos Nina Leen e LIFE Archive)


sábado, 23 de março de 2013

O militante do cinema


Manuel Cintra Ferreira 
(1942−2010)

Coisas boas em jornais

Cineastas favoritos: John Ford, John Ford e John Ford. Filme preferido: «A Desaparecida» que, reza a lenda terá visto mais de uma centena de vezes. Duvida-se que acredite já saber o filme de cor. Actor de eleição: John Wayne. Local de férias habitual: Campo de Ourique. Há aqui uma soberana harmonia que diz muito bem da pessoa que assim se passa para a prosa, nada turva, homericamente simples, porque quem sabe, sabe e não precisa de florear sobre o vazio. É muito fácil adivinhar de quem assim se fala. Manuel Cintra Ferreira, o crítico mais carismático da «praça» também por todas estas idiossincrasias, conhecido como possuidor de uma memória assombrosa e uma capacidade de trabalho verdadeiramente extraordinária.

Manuel Cintra Ferreira na antiga sala da Cinemateca. 1991. 
Foto Carlos Didelet, copiada do Jornal Se7e.

Segundo ele (porque eu acredito que se trata de um daqueles casos nascidos já com um gene estranho qualquer inatamente adaptado à coisa cinema), segundo ele, o vírus começou aos seis anos e foi o «coup de foudre». O filme era o «José do Telhado». As luzes, o movimento, tudo aquilo me apaixonou imediatamente. A partir daí sempre que podia estava lá caído.  Depois, foi como sempre é: aquilo que nos interessa passa doravante a ser objecto de um esquadrinhar sem tréguas até que o coração nos doa, e tem que ser muito. Primeiro os actores, que são para o garoto a parte mais real, estão ali, mexem-se. A seguir comecei a querer saber quem é que fazia, como é que se fazia, porque é que se fazia. Lia tudo o que havia. Não é muito dificil imaginá-lo tardes esquecidas na Biblioteca Nacional, quando esta era ainda sita no largo do mesmo nome, embrenhado em alfarrábios possantes, jornais e revistas (O «Diário de Noticias», o «Século»),  até chegar à fase de começar a elaborar fichas para nunca mais perder a mania.
A primeira prosa aconteceu de maneira curiosa e pela mão de Luís de Pina.  Pode-se dizer que foi ele quem, sem me conhecer, me iniciou nestas coisas da escrita. Foi através de duas cartas que lhe enviei a pedir (muitas) informações. Estava-se em 1959. Mais tarde MCF ingressa nos circuitos cineclubistas, que a curiosidade não era qualquer circuito comercial que a satisfazia. Acasos acabaram por o levar para o Cineclube Imagem, onde acabou por fazer parte da direcção durante vários anos. Foi por essa altura que comecei a escrever as minhas notazinhas — como ainda hoje, modesto, continua a referir os seus textos — em regime de voluntariado, é claro. Éramos uns carolas que faziam de tudo, desde traduções a textos originais. Foi aí que me tornei um verdadeiro militante do cinema.

John Wayne em A Desaparecida de John Ford.

No início dos anos setenta, devido a certos problemas que começavam a infectar o cineclubismo, afastou-se um pouco. Como aficcionado que se preza, porém, ia ver tudo, comprava todos os livros (insiste em ser sempre o primeiro a descobrir as novidades das Distris) e dedicava-se às revistas que iam aparecendo. Os sacrossantos Cahiers Du Cinema — que já então eu não via com muito bons olhos — (oh preconceitos!), a Positif, a Cinema Nuovo. Americanas nicles. E continuo a achar que os americanos têm vindo a colocar as questões do cinema de forma muito mais correcta que os franceses.
No período que sucedeu imediatamente ao 25 de Abril, também para estes lados as coisas aqueceram e começaram a surgir publicações nacionais diversas que MCF se diverte a recordar, fazendo sempre a vénia devida a Lauro António e a Duarte Ramos, os grandes impulsionadores de quase todos os actualmente nomes grandes da crítica. Entretanto, ia mais sobrevivendo que vivendo ali pelas bandas da Rua do Quelhas, como realizador da Antena Um, fazendo  coisas mais burocratas que criativas.  Não gosta de se alargar sobre o assunto que visivelmente não deixou grandes memórias. Até a Maria José Mauperrin o convidar para uma participação regular no memorável, saudoso, Café Concerto, onde apresentava apontamentos de tudo o que ao cinema dissesse respeito.

Manuel Cintra Ferreira no Café Concerto. 1983.
Foto copiada do Jornal Expresso.

A partir do meio dos anos oitenta já o seu percurso é público e a notoriedade inabalável. Aconteceu o «Expresso» (foi uma escola óptima, fundamental, com o João Lopes, o Leitão Ramos, o A.M. Seabra e o Vicente Jorge Silva),  a Cinemateca, a convite de Luís de Pina e Bénard da Costa e, mais recentemente, o «Público», onde escreve «como se disso dependesse a sua sesta». O Vicente meteu-se nessa história e fomos convidados a quase juntar a mesma equipa. Devo dizer que assim à primeira vista fiquei um bocado receoso. Mas acredito sempre numa experiência e nunca me arrependo. Aprendemos sempre qualquer coisa. Se eu soubesse o trabalho que me ia dar!... Ri-se e percebe-se que não está nem um pouco arrependido. Da capacidade de trabalho que aquelas páginas testemunham avança muito simplesmente: é que não consigo estar sossegado. Uma conversa, um filme, até a dormir estou sempre a pensar em coisas para escrever.  Garante que dorme o normal, deita-se à uma e levanta-se às sete. O normal. O normal?! Também deve achar normal os intermináveis ficheiros que possui sobre cinema, em papel e, sobretudo, na cabeça. E claro que é inacreditável. Só mesmo assistindo à frequência com que responde prontamente às perguntas de toda a gente sobre filmes estreados há um, dez, cinquenta anos, como se nada fosse.
Da crítica prefere não tecer considerações pessoalizantes, obviamente melindrosas, mas frisa o facto de ter havido períodos bem mais interessantes que o actual. Nos anos 30, altura do Cinéfilo e da Imagem, de António Lopes Ribeiro e José Gomes Ferreira, em que a critica era bastante capaz e agressiva e, depois, na altura do cinema novo, em que a critica era muito mais viva, provocante e, em certa medida, mais eficaz, não só para o público leitor como para a própria actividade cinematográfica. Sobre todas essas questões que são também o cinema, MCF afirma ser atribuição do critico pronunciar-se, coisas tão desagradáveis como ver um filme ser exibido num formato diferente daquele em que foi concebido, ou o desastre que é a exibição ser agora de pior qualidade do que quando havia censura, ou da forma como os filmes portugueses são, ou não são, exibidos. Mas, remata: o melhor crítico que existe é o tempo. Daí achar um pouco forçado autodenominar-se crítico. Sou um tipo que gosta daquilo que faz, tenta valorizar aquilo que gosta e não sente necessidade de destruir necessariamente aquilo de que não gosta.
Do que gosta verdadeiramente é do conceito de comunhão que Ford foi o melhor a encenar, a amizade de uma consistência que não é pedida, é dada. É algo que é mais ideal que existente: é pena... O gosto pelos temas fordianos não é igual ao amor dos natais ou sequer a uma relação familiar particularmente motivante. Sou, digamos uma pessoa com raízes. E tenho uma memória com uma certa força. São, decerto,essas raízes, que lhe permitem dizer que o cinema é Ford e o resto são satélites, ou que Portugal é Lisboa e o resto é paisagem. Sem ter medo dessas graças generalizantes porque sabe muito melhor que muita gente que é também dessas substâncias, crenças irremediavelmente certas, que são feitas as raízes. São com certeza elas também as responsáveis pela imensa disponibilidade de MCF que continua a correr com muito gosto, incansável, a enganar o tempo e as matérias a seu bel-prazer. Exactamente como faz o cinema.

Teresa Carmo
Se7e
21-11-91

terça-feira, 19 de março de 2013

David «Chim» Seymour e as estrelas


«Nascido Dideki Zsymin em Varsóvia, em 1911, passou a assinar CHIM (numa abreviatura fonética do apelido) ao tornar-se fotojornalista em Paris, por volta de 1932. Na América mudou o nome para Seymour, a fim de proteger os pais sob o jugo do nazismo (mas o novo apelido ainda soava mais judeu, como lhe fizeram notar os amigos!). Também era conhecido pelos diminutivos Dik (de Didek, isto é, David), Chimou, Chim-Chim (que é nome de panda). Com os seus olhos penetrantes, óculos, nariz proeminente e careca adiantada, lembrava um mocho sábio. Não tinha o ar atraente e morenaço de Capa, mas inspirava nas mulheres instintos protectores, o que vinha a dar na mesma. A fotografia ajuda a libido. O certo é que Chim era, à  sua maneira tímida e secreta, um conquistador inveterado (Rodger dizia que, neste campo, o próprio Capa tinha muito a aprender com Chim). Talvez por isso viria a apurar as lentes com as estrelitas talentosas — Gina Lollobrigida, Kim Novak, Joan  Collins, Ava Gardner, Audrey Hepburn, Sophia Loren, etc.»
(Jorge Calado, Expresso, 01-11-1996)


Sofia Loren com 19 anos. 1953. David «Chim» Seymour.

 Ingrid Bergman. 1952. David «Chim» Seymour.

  Ingrid Bergman e seu filho Robertino. 1952. David «Chim» Seymour.

  Ingrid Bergman. 1953. David «Chim» Seymour.

  Isotta e Isabella Rosselini, filhas de Ingrid Bergman. 1952. David «Chim» Seymour.

  Joan Collins com 18 anos. Londres.1951. David «Chim» Seymour.

 Barbara Laage. Paris. 1954. David «Chim» Seymour.

 Gina Lollobrigida.Paris. 1953. David «Chim» Seymour.

  Gina Lollobrigida. Itália. 1954. David «Chim» Seymour.

  Kirk Douglas. Paris. 1954. David «Chim» Seymour.

  Kirk Douglas. Paris. 1954. David «Chim» Seymour.



(Fotos de David «Chim» Seymour e chim.eastmanhouse.org)

domingo, 17 de março de 2013

Mário Viegas - INÉDITO

Mário Viegas diz e fala de Bocage no Café Nicola


Inédito, possivelmente de 1993. Com ligeiros problemas de som.



sábado, 16 de março de 2013

Lisboa por volta de 1900-1920 - Parte 3

Assim se faz Portugal


De Charles Chusseau-Flavies pouco se sabe, o fotógrafo francês terá trabalhado entre 1890 e 1910. Consultando a parte do seu trabalho que se encontra na George Eastman House, parece tratar-se de um dos primeiros repórteres fotográficos freelancer. Viajava com facilidade e tinha acesso a várias famílias reais europeias. Tinha também grande facilidade em fotografar quartéis e militares em exercício assim como o respectivo armamento, o que fez em vários países da Europa. Fotografava com muita frequência, cenas do quotidiano e fazia levantamentos etnográficos. Os ciganos na Roménia, negativos de alguma raridade e algumas vivências na Argélia, Marrocos e na Turquia, onde também adquiriu originais a (Sebah & Joailler), importante firma estabelecida em Constantinopla. Percorreu a maioria dos países da Europa.
(Excerto do texto, da  Associação Portuguesa de Photographia) Ler todo o texto AQUI

Rossio com as ruínas da igreja do Carmo ao fundo.

 Penitenciária de Lisboa.

 Praça dos Restauradores.

 Estação de comboios ao fundo e Teatro Nacional no Rossio.

 Praça do Comércio.

 Cais do Sodré.

Estação de Santa Apolónia.

 Teatro República, actual São Luiz.

 Teatro Nacional no Rossio.

 Teatro São Carlos.

 Estação de comboios do Rossio na Praça D. João da Câmara.

 Doca de Santos.

Porto de Lisboa.


(Fotos de Charles Chusseau-Flavies e da George Eastman House)


terça-feira, 12 de março de 2013

Silvana Mangano - A Vénus dos arrozais



Silva Mangano em Arroz Amargo (Riso Amaro, 1949) de Giuseppe De Santis.
Foto de theredlist.fr


Coisas boas em jornais


A Vénus dos arrozais que a Censura proibiu
Texto de Vítor Pavão dos Santos 
Jornal Se7e
21-02-80



"Tudo hoje quer cinema italiano
P'ra ver de perto as pernas da Mangano
Dantes a Rita é que era o chamariz
Hoje a Silvana é que dá que falar
E então nas ruas andam velhos
Andam novos, andam ginjas
Anda tudo a perguntar
Mas onde é que está o gato?
Sei lá! Sei lá!
Mas onde e que está o gato?
Sei lá! Sei  lá!"

Era assim que a revista, comentadora infalível da vida portuguesa, pela voz da grande Hermínia Silva, assinalava, em 1953, em Lisboa antiga, a loucura que então provocava o cinema Italiano e as suas vedetas. Tudo começara, quando, em 1951, Silvana Mangano surgira desafiadora, no écran do Tivoli, camisola colada ao peito farto, calções molhados e pernas nuas, mergulhadas, até ao joelho, nos arrozais, em Arroz Amargo (Riso amaro, 48), desencadeando o desejo do «bom» Raf Vallone e do «cínico» Vittorio Gassmann, tão próxima, tão verdadeira, logo conquistando o espectador lisboeta, derrubando as imagens technicoloridas das pin ups sofisticadas, como Rita Hayworth ou Betty Grable. Mas não seria por muito tempo que o público poderia gozar da beleza de Silvana, já que a vigilante censura salazarista, também visivelmente perturbada, mandou retirar o filme de exibição, 14 dias após a estreia, alegando, entre outras idiotices, abundância de «mulheres em roupagens sumárias». E lá se foi a Silvana mondadeira (...). O escândalo do filme não era facto inédito, pois nos Estados Unidos também a legion of decency condenara Bitter Rice. Só que lá, o caso até serviu de publicidade ao filme, que rendeu a considerável soma de seis milhões de dólares. Mas por cá, tudo era bem diferente — tirava-se a fita de circulação e não se davam mais satisfações. 

Silvana Mangano e Dino De Laurentiis com as filhas em Monte Carlo. 1966. Carlo Bavagnoli.


Porém, o que a censura não podia impedir era que a imagem avassaladora da belíssima Silvana ganhasse o prestigio do fruto proibido. E o público, que esperava ansioso noticias dela, lá a conseguiu ver, em 1952, moldada pela combinação preta, indispensável acessório das vamps neo-realistas, em O Lobo da Calábria (Il lupo della Sila, 49), disputada mortalmente por Amadeo Nazzari e Jacques Sernas. E não ficou desiludido. Porém, o sucesso louco, que fez Lisboa andar com a cabeça à roda e esgotar semanas e semanas o Império, foi Anna (Anna, 51), onde La Mangano, com aquele seu ar indiferente e um tanto enjoado, ora era desvelada freira-enfermeira, ora, de quando em quando, recordava o seu passado de provocante cantora de cabaret fumarento, mais uma vez dividida entre o «bom» fazendeiro Raf Vallone e o «cínico» barman Vittorio Gassmann. Dolente, em estudadas poses coleantes, Silvana cantava, com a voz emprestada por uma qualquer cantora ignorada, uma melodia melancólica, T'ho voluto bene, e um remexido balão, o célebre Balão da Ana, cantigas que causaram um furor tremendo, e a telefonia tocava a toda a hora, sendo até gravadas pela Amália, a primeira com versos em português, do jovem poeta David Mourão-Ferreira. Nesse ano de 1953, Hermínia estava, portanto, absolutamente certa, a Silvana é que dava que falar, a tal ponto que, num inquérito da revista Plateia, 82 por cento dos seus leitores declararam ser ela a sua preferida.

Silvana Mangano e sua filha em Voivodina, Jugoslávia, durante as filmagens 
de Tempestade (La Tempesta, 1958) de Alberto Lattuada. 1958. Gjon Mili.


A serena «signora» de Laurentiis

Mas esta loucura não acontecia só por cá, mas um pouco por toda a parte. Filha de pai italiano e mãe inglesa, Silvana Mangano estudara dança, fora manequim e tentara o cinema, até que, em 1948, conhecera o produtor Dino de Laurentiis, com quem logo casara, o qual, cuidadosamente, preparara o seu lançamento. E o produto mostrara-se de tão boa qualidade que o dificílimo mercado americano se mostrava muito receptivo, a ponto do New York Times afirmar entusiasmado, ser miss Mangano uma mistura de Anna Magnani, com menos 15 anos, Ingrid Bergman, com temperamento latino, e Rita Hayworth, com 12 quilos a mais.
Perante esta aceitação internacional, Silvana apareceu, em 1954, em duas grandes produções italo-americanas. Um era Mambo, tentativa pouco conseguida de explorar o filão de  Anna, onde se entregava a danças ardentes, com o  ballet  negro de Katherine Dunham, casava com Michael Rennie, um conde hemofílico, e era mais uma vez tentada por Vittorio Gassmann, o seu «cínico» privativo. O outro, Ulisses (Ulisse), onde se desdobrava num duplo papel, a paciente e tecedeira Penélope e a feiticeira Circe, enredando, nos seus encantos, Kirk Douglas, o herói homérico desta supercolorida odisseia de cartão e purpurina.

Silvana Mangano, durante as filmagens de Tempestade (La Tempesta, 
1958) de Alberto Lattuada. Voilodina, Jugoslavia. 1958. Gjon Mili.


Entretanto, a extrema sensibilidade com que Silvana viveu uma amargurada prostituta, num dos sketchs de Oiro de Nápoles (L'ro di Napoli, 54), dirigida pelo seu grande amigo Vittorio de Sica, valeu-lhe ser distinguida com o  Nastro d'argento, para a melhor actriz italiana do ano, prémio que novamente conquistou, em 1964, pela criação da figura da condessa Edda Ciano, a célebre filha de Mussolini, em Il processo di Verona, um filme, nessa época, proibido em Portugal, e que ainda por cá não correu. Embora estas distinções tenham dissipado o preconceito generalizado de que as mulheres que se impõem pela beleza têm, por força, que ser más actrizes, a signora Di Laurentiis, olhando pelos filhos, no conforto da sua villa  romana, mostrava-se pouco interessada em se assumir superstar, limitando muito as suas aparições, ainda por cima geralmente breves, apesar da sua presença, sempre belíssima, ser, com frequência, a melhor coisa de algumas superproduções do seu marido, como A revolta dos cossacos (La tempesté,  58), d'aprés Pushkin, também se revelando uma excelente comediante, em  Crime (Crimen, 60), ao lado dos experimentados cómicos Alberto Sordi, Nino Manfredi e o sempre presente e excelente Vittorio Gassmann.

Silvana Mangano durante as filmagens de Cinco Mulheres Marcadas 
(Five Branded Women, 1960) de Martin Ritt. Austria. 1959. Gjon Mili.


A presença de prestígio seguro

Em 1966, comemorando quase vinte anos de feliz casamento, De Laurentiis ofereceu á mulher um presente caríssimo, que consistiu num filme, em sketchs, todo centrado em Silvana, que interpretava cinco personagens muito diversas, dirigida por cinco dos mais importantes realizadores Italianos: Luchino Visconti, Mauro Bolognini, Pier Paolo Pasolini, Franco Rossi e Vittorio De Sica. Como geralmente acontece com encomendas deste tipo, A magia da mulher (Le streghe) foi uma tremenda decepção, em que apenas o episódio de Pasolini, La terra vista dalla luna, com Totó e Ninetto Davoli, se destacava, pela sua colorida invenção surrealizante.

No entanto, a partir de então, Silvana Mangano alcançaria um enorme prestigio, passando a ser indispensável ás obras de dois grandes realizadores, já desaparecidos, Pasolini e Visconti, que finalmente saberiam compreender e usar plenamente a sua beleza, o seu talento, e, mais do que tudo, a sua estranha presença. Dirigida por Pasoloni, ela seria uma Jocasta, primitiva e misteriosa, em Edipo Re (67), um filme multo belo, incompreensivelmente ainda inédito em Portugal; uma reprimida mãe de família, da alta burguesia, que, tocada pelo anjo desencadeador (Terence Stamp), desabrocha numa maravilhosa ninfomaníaca, em Teorema (68); e, numa breve aparição, a Virgem Maria, no esplendor da visão final de Giotto, em Decamerone (71)


Jeanne Moreau e Silvana Mangano brincando durante as filmagens de Cinco Mulheres 
Marcadas (Five Branded Women, 1960) de Martin Ritt. Austria. 1959. Gjon Mili.


Dirigida por Visconti, vestida com suprema elegância por Piero Tosi, marcaria três figuras inesquecíveis de mulher distante e requintada: a mãe, anos 10, do jovem Tadzio, em Morte em Veneza (Morte a Venezia, 70); Cosima Lizt, a enigmática companheira de Richard Wagner, em  Luís da Baviera (Ludwig II, 72); a snob riquíssima e inquieta mantedora do gigolo Helmut Berger, em Violência e paixão (Gruppo  dl  famiglia in un interno, 74), a sua última aparição no cinema, até  à data. Semi-retirada desde há seis anos, apesar de apenas em Abril próximo completar 50 anos, semi-separada de Dino De Laurentiis, actualmente um dos mais poderosos produtores do cinema americano, a trajectória de Silvana Mangano, de mondadeira, explosiva força da natureza dos arrozais neo-realistas, a delicadíssima e serena aristocrata, movendo-se entre rendas e suspiros, é uma das mais fascinantes de quantas o cinema tem para nos oferecer.

Vítor Pavão  dos Santos
Texto e Titulos
Jornal Se7e
21-02-80

Vera Miles, Barbara Bel Geddes, Carla Gravina, Silvana Mangano e Jeanne Moreau em Cinco 
Mulheres Marcadas (Five Branded Women, 1960) de Martin Ritt. Austria. 1959. Gjon Mili.


Silvana Mangano (1930-1989). Jugoslávia. 1958. Gjon Mili.


(Fotos LIFE Archive, excepto a primeira)